sábado, 8 de agosto de 2015

HISTÓRIA DE REPÓRTER EM PETROLÂNDIA DO ANO DE 1983



Cidades submersas podem carregar incríveis mistérios. Perceber ali como era a vida de moradores, anos antes das inundações, é algo que mexe com a cabeça dos mais curiosos. Mas a situação intrigante não precisa acontecer apenas em cidades que desapareceram de maneira misteriosa, como a lendária Atlântida.

O Brasil não fica de fora da lista. Encravada na beira do lendário Rio São Francisco, Petrolândia, a 470 km do Recife, foi inteiramente submersa nas águas do Velho Chico para dar lugar a usina hidrelétrica Luiz Gonzaga, no Lago de Itaparica, uma das mais modernas do complexo da Chesf. O que era uma cidade hoje fica escondido em nada menos do que 12 bilhões de metros cúbicos de água.

Na verdade, as cidades submersas são muito mais comuns do que podemos imaginar e estão espalhadas por todo o mundo. No caso da pernambucana Petrolândia, onde estive em 1988, ano em que desapareceu, o único vestígio da sua existência está nos arcos de uma igreja, que aparece em meio à água quando a seca reduz a capacidade de armazenamento do Lago de Itaparica.


A nova Petrolândia, para onde a população da velha cidade foi transferida, fica apenas a 10 km da cidade original e figura entre os dez maiores municípios arrecadadores de impostos do Estado por quase dos royalties da Chesf. Na cobertura que fiz em 1988, mostrando o adeus da população à terra em que nasceu e que iria virar uma miragem, uma viagem em busca do passado, lembro do povo chorando nas ruas.

Lembro do drama que perdurou nas indenizações por parte da Chesf. A antiga Petrolândia tinha duas igrejas. Uma delas ficava no ponto central da cidade. “Vou ficar com muita saudade, muita lembrança. Quando a gente é jovem, marca muito”. O desabafo foi de José Francisco Lima, um pequeno comerciante, que encontrei em meio ao clima de emoção fazendo a sua transferência para a nova cidade.

Quem vê, hoje, quando o lago seca, as imagens do templo submerso, não tem ideia do drama da população da velha Petrolândia. Quando a água começou a invadir a cidade e as áreas rurais, alguns moradores se recusavam a deixar suas casas, como Francisco Assunção, que nasceu por lá, criou seis filhos na roça e foi um dos últimos moradores a sair.

“Perder a cidade que a gente nasce é como perder também muito da nossa vida. Afinal, a maior referência de nossas vidas é o nosso canto, saber de onde a gente saiu”, afirmou Francisco, que encontrei por lá, também, com uma cara de tristeza e com a incerteza que abalava a população com a transferência para uma área onde tudo teria que ser construído para abrigar os transferidos forçadamente.

Francisco tinha razão em estar com uma enorme interrogação quanto ao seu futuro. Passados 27 anos da inundação da velha Itaparica, mais de 10 mil agricultores dos Projetos de Irrigação de Itaparica reclamam que a Chesf não cumpriu com o acordo de reassentar dignamente os que perderam suas terras produtivas.

Desde a década de 1980, eles vivem nos Perímetros Irrigados de Itaparica, abandonados, sem energia, sem terra e sem condições de produzir nada. Valdenor de Melo espera há 27 anos a terra e a indenização monetária que lhe cabem porque sua antiga propriedade ficou debaixo da água da represa da hidrelétrica de Itaparica, no rio São Francisco.

“Vou receber, tenho fé”, diz ele. A família Melo é uma das 10 mil deslocadas, segundo dados oficiais, pelas águas represadas para gerar eletricidade a partir de 1988, com capacidade para 1.480 megawatts (MW). Mas o número real de deslocados é quase o dobro. São cerca de 80 mil pessoas, afirma o antropólogo norte-americano Russell Parry Scott em seu livro Negociações e Resistências Persistentes, baseado em estudos do Núcleo de Família, Gênero e Sexualidade da Universidade Federal de Pernambuco, onde é professor.

Numa reportagem de Chico José, para o Fantástico, vi, recentemente, as ruínas da velha Petrolândia. A igreja matriz da velha Petrolândia não resistiu ao tempo. Suas paredes ruíram e apareceram completamente destroçadas, no fundo do Lago de Itaparica. Mas a Igreja do Sagrado Coração de Jesus está resistindo há 23 anos.

A escadaria que dava acesso à igreja apareceu coberta por uma camada de lama. O templo, vazio. Todos os bancos foram retirados antes da enchente. Na parede, foi possível ver o nicho onde ficava a imagem do Coração de Jesus. Os janelões, que eram decorados por vitrais, também foram mostrados, abertos.

No local do altar-mor, apareceu a cruz de pedras, incrustada na parede central, com a pequena plataforma, que era base de apoio da imagem de Jesus Cristo. Foi o que restou do recinto sagrado.

Bombeiros chegaram a mapear as ruínas da cidade submersa, para criar um novo ponto de mergulho para turistas que gostam de aventura, conseguindo chegar à Charqueada, uma antiga fábrica de doces e o maior prédio da antiga cidade e a velha estação ferroviária, um tesouro do início do século passado. 

Do Blog do Magno Martins

Postado por PN Petrolândia Notícias
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PETROLÂNDIA-PE

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Lago de Itaparica - Prainha- Mirante da Serrota- (Foto: Alexandre Sertão) - Vista da BR 316

Mirante da Serrota (foto: Alexandre Sertão)

Mirante da Serrota (foto: Alexandre Sertão)
Petrolândia-PE, Sertão de Itaparica

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